40 é o limite? Desde quando (e até quando) a vida profissional das mulheres tem data de validade

“Não tenho mais tempo”; “meu tempo já passou”; “me sinto atrasada”; “tenho medo de não ter mais oportunidades”. Essas foram algumas das expressões que apareceram na pesquisa feita pela Fin4She – plataforma que fundei com o objetivo de conectar mulheres e promover a equidade de gênero – com centenas de mulheres, sobre etarismo.

Por definição, o etarismo é a discriminação de pessoas com mais idade pelo julgamento errôneo de que esse público é incapaz de exercer algumas funções. Na prática, esse preconceito atinge muito mais mulheres do que homens. Quando se pensa em um profissional bem-sucedido e experiente, acima dos 40 anos, é muito comum (infelizmente) imaginar um homem.

No imaginário coletivo, o profissional homem mais velho é visto como sênior, experiente, mais potente, mais preparado. Para o executivo, o grisalho é sinônimo de conhecimento e poder. Para nós, mulheres, os adjetivos mais comuns são “desatualizadas, atrasada, sem agilidade”. Com o objetivo de entender melhor o impacto desse preconceito no dia a dia delas, lançamos uma pesquisa sobre como o etarismo impacta a carreira das profissionais. O resultado só reforça o que já sabíamos: Quase metade das participantes já escutou comentários negativos sobre a própria idade no ambiente de trabalho;
.70% delas já se sentiram não ouvidas por questões de idade;
.52,7% têm a percepção de que a idade dificulta a ascensão na carreira;
.73,5% dizem que a empresa não promove ações de combate à discriminação pela idade;
.78,3% sentem que idade influencia mais a carreira das mulheres do que dos homens;
.54,4% entendem que pessoas com menos de 40 anos têm mais oportunidades de promoção.
No total, a pesquisa recebeu 226 respostas de mulheres. Também deixamos um espaço para que escrevessem livremente sobre a própria experiência. A sensação coletiva é de que a carreira de mulheres tem data de validade: 40 anos. Muitas falam sobre não conseguir mais oportunidades após essa idade, não receber promoções, deixar de ser ouvida e até mesmo ser demitida.

São inúmeros os casos de profissionais que são cortadas de um processo seletivo assim que precisam informar a idade; ou ainda de mulheres que são cobradas por “naquela idade ainda não ter uma carreira estruturada e estabelecida”. Mas quem define o que é ser bem-sucedida? Isso não deveria caber apenas a nós mesmas?

De forma massiva, a pesquisa mostra a insegurança e o medo das mulheres com mais de 40 anos no mercado de trabalho. Foram vários os relatos de que o mercado não oferece mais oportunidades, de que o “tempo está acabando”, que a chance já passou. Os números e os relatos escancaram o etarismo feminino no mundo corporativo.

Mas, ainda mais do que isso, o que a pesquisa realmente nos fez perceber é que a pressão e o preconceito sobre as mulheres ocorrem durante toda a vida profissional. Recebemos muitos relatos sobre o preconceito com mulheres jovens em cargos de liderança, que são consideradas inexperientes e incapazes.

Quando chegam na casa dos 30 anos, o “problema” é a maternidade, que é vista pelos empregadores como um peso e que vira uma preocupação para as mulheres. Não à toa, uma pesquisa do site Empregos.com.br mostrou que 35% das mulheres têm medo de engravidar e perder o emprego.

Depois disso, chegam os 40 anos, que parece ser o limite produtivo para nós. Mas, desde quando (e até quando) a vida profissional de nós, mulheres, tem data de validade?

Somos novas demais para liderar, ou somos velhas demais para isso, ou somos mãe. Parece sempre haver um problema. O que precisamos fazer é encontrar onde (ou em que) está o verdadeiro problema. E, o mais importante, como acabar com ele. Não somos inexperientes, não somos desatualizadas, não somos ultrapassadas e nossos filhos não nos fazem profissionais piores. Nós queremos mais, queremos ir além.

Quem foi que disse que mulheres de 40, 50, 60, 70 anos, com uma sólida e consolidada carreira, precisam parar de trabalhar? E se elas quiserem criar projetos, tocar iniciativas com propósito, fazer algo de diferente para a comunidade, para o setor em que trabalham, e [por que não?] para o mundo?

As empresas, instituições e organizações precisam implementar mecanismos de combate ao etarismo. Que tal fazer etapas de processos seletivos às cegas? Abrir programas de bolsas e de progressão de carreira sem limite de idade; ou então estruturar planos de carreira que não acabem nos 40 anos.

Por aqui eu tenho 38 anos, e estou apenas começando a minha jornada empreendedora na Fin4she. Eu me reinventei profissionalmente e comecei a minha empresa após a maternidade. Nunca estive tão fora da zona de conforto, estudando, aprendendo coisas novas diariamente e o que eu mais percebo em relação a idade é a qualidade dos relacionamentos. Quantas pessoas incríveis tenho a oportunidade cada vez mais de me conectar, com profundidade e verdade. São verdadeiras aulas que só a maturidade nos permite vivenciar e principalmente, apreciar.

Talvez não tenhamos as respostas de como resolver o problema do etarismo feminino no mundo corporativo, mas precisamos refletir e cobrar para que o cenário mude em algum momento. Precisamos alimentar e renovar os nossos sonhos frequentemente e não esquecer da importância do exemplo, do legado que queremos deixar para as próximas gerações. Afinal, a vida profissional das mulheres não tem data de validade.

*Carolina Cavenaghi é cofundadora e CEO da Fin4she, uma plataforma que conecta e impulsiona negócios e pessoas através da diversidade. É responsável por liderar e implementar projetos que promovem o protagonismo e a independência financeira feminina, buscando ampliar e fortalecer a presença de mulheres no mercado de trabalho.

É a idealizadora do Women in Finance Summit Brazil e do Young Women Summit, eventos que já reuniram milhares de pessoas. Foi executiva da Franklin Templeton por mais de dez anos e trabalha no mercado financeiro desde 2006. Atualmente mora em Teresina, no Piauí, é mãe do Tom e do Martin e, através da Fin4she, tem a missão de transformar a forma como o mercado e as pessoas se conectam com a equidade de gênero.

Fonte: Exame

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